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  • Foto do escritorFilmes do Mato

Entrevista com Luiza Reis

Em 2016 eu era bolsista no estúdio de Cinema Almeida Fleming, do Instituto de Artes e Design da UFJF, e co-dirigi meu primeiro filme em parceria com dois amigos que trabalhavam no estúdio. Todo o processo do curta-metragem "Meu mundo acaba hoje" foi bem experimental, inclusive grande parte da história foi sendo desenvolvida no decorrer das gravações. No fim deste mesmo ano me veio a ideia de uma nova história, que fui maturando ao longo de meses, até iniciar o bacharelado em Cinema e Audiovisual pela UFJF em 2017, onde pude elaborar o roteiro do curta com acompanhamento do professor Sérgio Puccini, na disciplina "Roteiro: teoria e prática". Ainda em 2017, o roteiro de "Se fosse assim será que seria" foi aprovado no "Laboratório de Curtas" do Luzes da Cidade, onde teve a oportunidade de ser aperfeiçoado, e recebeu menção honrosa no pitching final do Laboratório. O filme foi rodado em 2017 e finalizado em 2018, tendo seu nome alterado para "As luzes apagadas e o resto do mundo". Em 2018, dirigi o videoclipe "Midnight Show", da artista local Flopsy Franny (disponível no Youtube), co-dirigi o mini-doc poético "Lar de Fora" e por fim roteirizei, produzi e dirigi o filme "Há tempos não vejo minha mãe", que foi apresentado como meu TCC. Vale ressaltar que ao longo desses anos de formação participei de outros curta-metragens e um longa nas equipes de produção e arte, principalmente. Atualmente estou em processo de desenvolvimento de um videoclipe e de um documentário.


Set do filme "Há tempos não vejo minha mãe". Foto de Elisa Chediak


Quando iniciei o processo de revisitar memórias da infância com a minha mãe, foi surgindo uma miscelânea de lembranças boas e ruins. Em determinado momento tive de optar por qual caminho iria seguir, e entre a exploração das experiências ruins ou boas, as possibilidades de referências estéticas/ visuais eram muito diversas. Por fim, deixei de lado "Eu matei minha mãe" (Xavier Dolan, 2009) e abracei "Projeto Flórida" (Sean Baker, 2017), para me guiar nessa escolha consciente de projetar um olhar mais generoso sobre essa mãe representada, ao invés de ressentido. Acredito que futuramente, com mais maturidade emocional e profissional, eu arrisque adentrar este outro território, quem sabe dando espaço a um olhar mais "sombrio" sobre a relação mãe e filha. Por fim, acredito que as maiores dificuldades ao transpor minhas memórias para uma narrativa foram também as maiores alegrias, nessa mistura agridoce que é recordar o passado.


Minhas principais referências para a direção infantil foram o já citado “Projeto Flórida”, do Sean Baker, que apesar de ter sido uma referência estética, também me interessava bastante pela cumplicidade do diretor com suas personagens. “A culpa é do Fidel”, (Julie Gavras, 2006), também foi uma forte influência pelo fato de ser possivelmente uma autobiografia de Gavras, o que garantiu uma direção atenta à sua protagonista mirim, com enquadramentos respeitando o espaço que seu corpo pequeno ocupa na tela, e assim, escutando com atenção o que ela queria dizer. Eu poderia citar algumas outras referências mais indiretas, mas prefiro finalizar com a fotógrafa britânica Frances Kearney, em suas séries “Seven year olds still at play” (1999) e “Like mother, like daughter” (2000), fotografias que captam de maneira melancólica e sensível o cotidiano de famílias e crianças comuns.


Set do filme "Há tempos não vejo minha mãe". Foto de Elisa Chediak


Para a difícil tarefa da direção de arte contei com duas amigas incríveis cujas estéticas pessoais já são naturalmente embebidas na atmosfera 90’s. Lara Nonato e Bárbara Maria rodaram todos os brechós da cidade, reformaram peças, conseguiram raridades emprestadas com colecionadores, etc. Boa parte dos objetos cênicos que usamos vieram de outras cidades, Rio de Janeiro, Volta Redonda, Miguel Pereira… A comunicação com as meninas foi super tranquila, elas estavam empenhadas no projeto, trabalhando de corpo e alma.


Ao meu ver, a cena audiovisual em Juiz de Fora já acontece há tempos, e existem diversas empresas especializadas que são reconhecidas pela cidade. Entretanto, quando se restringe ao Cinema, me parece algo mais recente. Embora o Primeiro Plano esteja indo para sua 18ª edição, ou seja, há quase 20 anos existe uma oferta e demanda comprovada da produção local, acredito que o curso de Cinema e Audiovisual da UFJF possa ter sido um dos maiores incentivadores a uma produção regular e constante, que também é criativa e questionadora.


Set do filme "Há tempos não vejo minha mãe". Foto de Elisa Chediak


Durante esse período de isolamento tenho estudado bastante sobre Cinema e Audiovisual, e visto filmes de gêneros e formatos variados. Estou num momento de busca por uma expansão conceitual, estética, temática e representativa da imagem. Sei que tenho muito a descobrir sobre o universo do Cinema, da teoria às complicações burocráticas da prática, e estou disposta a fazê-lo. Enquanto isso, desenvolvo projetos que precisarão de tempo para acontecer, afinal, saindo do meio acadêmico, o olhar sobre a prática muda. A disponibilidade e energia pra realização de projetos no modo “guerrilha”, juntando os amigos para gravar sem dinheiro nenhum, não são as mesmas. Optei então por desenvolver meus roteiros com calma, estudar e praticar exercícios de edição, e ando cada dia mais interessada em Cinema experimental e curadoria de festivais.


Ao meu ver o Cinema independente brasileiro é, antes de tudo, necessário. As tecnologias digitais abriram portas para pessoas que há duas décadas atrás jamais teriam acesso aos equipamentos de filmagem da época, o que permite a produção de imagens novas, potentes e múltiplas como nunca antes vistas. Entretanto, para que esses filmes sejam realizados é preciso incentivo e investimento. Para que sejam exibidos, espaços e infraestrutura. E para tudo isso ocorrer em quantidade e com qualidade, seria necessário o apoio de um governo federal competente e comprometido com a cultura. Ou seja, estamos atravessando tempos difíceis.

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