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  • Foto do escritorFilmes do Mato

Entrevista com Lucas Alexander

Meu primeiro contato com essa área das artes (audio) visuais foi antes da faculdade, comecei cobrindo alguns shows na minha cidade de origem. Entrei na UFJF em 2013, num curso interdisciplinar de artes e design que permitia uma especialização e escolhi cinema e audiovisual como que por acaso e descobri ao longo do curso que eu gostava muito. Realizei uma série de exercícios e alguns curtas desde a graduação em artes, mas foi nos semestres finais que me envolvi com algumas produções que, por acaso, envolviam a Filmes do Mato. No curso de cinema, acabei sendo da turma do Luis Bocchino de quem acabei me aproximando e se tornou um amigo, o que levou também a conhecer Bruna Schelb e todo mundo desse círculo de pessoas talentosas. Dessas últimas experiências audiovisuais, que acredito que foram as que de alguma forma mudaram meu olhar sobre o fazer cinema, vale citar "Ana" da Janis Blá, em que fiz a fotografia e a finalização, posteriormente o curta da Luíza Reis de nome "Há tempos não vejo minha mãe", convidado a ajudar na produção e que pra mim foi uma baita experiência.


Foto dos bastidores de "Há tempos não vejo minha mãe". Foto de Elisa Chediak


Posteriormente, num convite seguido participei do "Janaína sem cabeça" da Bruna Schelb Corrêa. A gente acaba aprendendo um monte de coisa na Universidade mas só quando atuamos fora da zona do “exercício” é que parece que a gravidade começa a atuar. Com uma proposta de imersão, mergulhamos numa viagem rumo à Ibitipoca, uma vila rural no interior de Lima Duarte, Minas Gerais. Uma experiência marcante de trabalho em equipe. Atuei na pré-produção junto ao João Gabriel e com a presença da Bruna e do Luis Bocchino conseguimos resolver outros trabalhos como a logística de transporte da equipe, alimentação e todas as necessidades que poderiam aparecer. No set o trabalho se torna descobrir o que é necessário e mobilizar cada setor da equipe para que as gravações fossem o mais fluidas possível.


Dentro de produções cinematográficas, a pior coisa que pode acontecer em um set de filmagem é o ator ou atriz estar pronta e a gravação não acontecer por um setor que não esteja parado, atrasado ou com algo faltando. Essa atriz ou ator pode "esfriar" e o resultado pode ficar aquém do que ele ou ela poderia entregar. Todo o setor da produção se destina a permitir que aqueles poucos minutos entre o ação e o corta aconteçam da forma que o diretor quer. Isso fica mais fácil quando você mantém um know-how das diversas áreas e esse é o lado bom da minha formação interdisciplinar, passei por várias áreas durante o curso, tenho um bom conhecimento da parte fotográfica, quase uma especialização em gambiarra… enfim, essas coisas ajudam na hora de prever algum cenário possível dentro de um filme e estar pronto para que nada nem ninguém fique para trás.


A organização de cada produção varia muito da proposta do filme e das necessidades, mas o lema é sempre estar a frente com algumas coisas básicas: todos precisam chegar ao set, comer, se sentir bem e estarem num ambiente confortável. Bater algumas datas com a diretora ou diretor, planejar a filmagem, pensar a decupagem das gravações, saber onde será gravado, se é acessível e como levar a equipe, se é um lugar afastado de coisas como mercados, centro comerciais, que muitas vezes pode ajudar numa situação de imprevisto durante as filmagens ou mesmo do que seria preciso levar pois não teremos acesso. Se é estúdio, o que as equipes de arte precisam para adereçar artistas e cenário? Todo o equipamento da fotografia e som estão certos? Qual o horário reservado no estúdio pra essa produção? A decupagem da conta? As perguntas vão se sobrepondo. Organizar é a chave, a pré produção é muitas vezes esquecida e pode não ser nela que a magia acontece, mas é o quando que vai permitir o filme acontecer, não só na produção em si mas outras áreas como o departamento de arte ou de fotografia planejando enquadramentos e conceitos de montagem que querem ser impressos no filme.


Foto dos bastidores de "Há tempos não vejo minha mãe". Foto de Elisa Chediak


Sendo muitas vezes o trabalho conectar as pessoas e cobrar o andamento do filme, além prover o que cada setor precisa para que nada deixe de funcionar, paciência é a chave. Acabei me encontrando mais numa produção de set. Com o tempo de gravação todos vão ficando cansados e hora ou outra alguém vai ser mais ríspido ou dizer pedir algo de forma mais enérgica. O que aprendi foi que nesses momentos não tem nada de pessoal, é preciso levar tudo na boa. Muita gente pode achar que foi falta de educação, paciência, etc. Quem vai fazer qualquer tipo de trabalho nesse setor de produção, o segredo é ter memória curta, cabeça fria, um olho no peixe e outro no gato.


Um produtor ou produtora, talvez pareça óbvio, mas a função dele ou dela é produzir aquele filme. E aí temos uma série de tipos de produção que variam em quantidade e tamanho de equipes de acordo com os orçamentos, pode ser quem vai produzir organizando as pessoas, ligando para atores, convencendo patrocinadores, juntando a burocracia e papelada ou organizando dinheiro e recursos como no caso do produtor executivo. 


A figura do produtor numa dessas super produções comumente conhecidas é ligada a um imaginário de poder, daquele que decide os limites e como a banda vai tocar. Em parte isso ocorre com produções grandes, afinal, existe a hierarquia e ela começa por quem viabiliza material e logisticamente o filme. Mas geralmente numa produção de menor orçamento a coisa se torna um pouco mais gerencial, as funções vão se sobrepondo em diversas áreas e a produção é a que de alguma forma fica dispersa se alguém não concentrar essas responsabilidades. Quando não há essa pessoa nas produções "menores" sobra pra toda a equipe, geralmente pro diretor ou diretora ou para outra pessoa ali que tem alguma personalidade organizadora, carismática ou controladora.


Juiz de fora é uma cidade incrível em diversos aspectos. Conta com um cenário cultural bem alimentado para uma cidade do seu porte e distante da sua capital e possui várias políticas culturais, como a lei Murilo Mendes que atende diversos setores culturais da cidade. E também a presença da UFJF que tem muito a ver com isso, trazendo um contingente de estudantes de diversos lugares do país graças a universalização do ENEM e a concentração de pesquisadores que permite que a cidade tenha um fluxo de ideias plural, uma característica cultural que geralmente se associa à capitais. Muitas pessoas não se dão conta, mas o progresso vem com a vontade de abraçar o futuro e as Universidades Federais permitem isso. Eu acredito que Juiz de Fora tem a oportunidade de se tornar um pólo audiovisual de primeira, tem uma certa cultura audiovisual que já existe na cidade, mas que acredito que possa expandir bem mais. Cinema é divulgação, é criação de afinidades, é economia e também é a cara de Juiz de Fora. 


Foto dos bastidores de "Baixas lendas da classe média baixa: Janaína-Sem-Cabeça".

Foto de Leonardo Morais


Trabalhar com a Filmes do Mato é uma experiência muito bacana. É uma equipe muito aberta a ideias e cheia de sugestões. Com bastante experiência em várias frentes e que sempre te surpreende. Estão sempre pensando no próximo passo pra não deixar a peteca cair, além disso a experiência fala muito. A Bruna Schelb, que fundou a Filmes do Mato, carrega uma trajetória bacana com ela das produções como do longa metragem IMO (2018) e que além de uma baita diretora é uma roteirista maneiríssima, junto com ela tá o Luis Bocchino que hoje integra a Associação Brasileira de Cinematografia e é também um grande editor de vídeo. São duas pessoas maravilhosas na cabeça dessa empresa e que se esforçam em fazer tudo da melhor maneira, assim como o Felipe Monteiro, Luíza Reis e o Vinícius Martins… é o dream team do audiovisual. Do mais, a Filmes do Mato é uma produtora com muita energia e que conta com uma equipe excepcional.


A produção nacional de filmes é produto da paixão por cinema e, no cenário independente, a coisa não é diferente. O cenário independente, é bacana por uma certa liberdade de escolhas que podemos ter ao criar, esse tipo de produção geralmente tem como um berço os festivais de cinema. Mas não só, muito cinema independente ganha destaque em algum momento e amplia seu público, chegando na televisão ou mesmo em plataformas de streaming. E o legal fazer filme é quantidade de pessoas que se junta para realizar aquela obra, é preciso muita gente, é um monte de emprego sendo gerado que vai desde antes de filmar até o momento dele ser exibido.


Mas esse termo independente é interessante. Independente de quê? Independente financeiramente? Do estado? Geralmente se entende que são produções de baixo orçamento e falta de dinheiro também pode ser uma forma de dependência. Talvez devêssemos pensar num cinema “possível” ou “desvinculado”, que apesar de tudo, existe. E resiste. Eu acredito que o cenário independente tá se expandindo de  alguma forma, tem mais gente com equipamento e conhecimento produzindo ótimas obras e podendo colocar a sua voz no mundo. Isso é algo que o cinema independente permite e acredito que seja sua melhor parte. Cinema é sonho, diria o Buñuel. Quem faz filmes precisa sonhar muito. 


 Resta ao cinema independente brasileiro, assim como outros setores culturais manterem a chama da poesia acesa mas com o pé firme no chão. É preciso criar estruturas mais sólidas, mais duradouras e que permita sustentar, como bem metaforizou a Bruna Schelb, essa árvore que é o cinema nacional. O cinema árvore, o cinema cachoeira, o cinema pau-brasil.

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